quinta-feira, 11 de março de 2010

O abuso de antibióticos no Brasil - parte I

Vivemos num país onde a cultura da auto-medicação está infiltrada em todos os níveis sociais. Vivemos num país onde, também, há muita prescrição indevida de antibióticos, pelos mais variados motivos. Após ler o relato de Marcos Losekann no twitter, senti uma certa invejinha dos colegas londrinos – nada que eu nunca tenha sentido em congressos internacionais da minha especialidade.

A pediatra que atendeu suas duas filhas não prescreveu antibiótico para um quadro suspeito de otite e amigdalite. Losekann estranhou. Afinal, aqui no Brasil não é preciso muito para sair de uma consulta com uma receita de Azitromicina, Amoxicilina ou tantas outras ‘inas’ na mão. Iniciou-se então o debate. Fiz uma busca rápida na PubMed, site que reúne as mais respeitadas publicações de saúde do mundo, e encontrei este artigo, que são as guidelines da Associação Americana de Pediatria para o tratamento de quadros de otite. Lá está escrito, entre outras coisas, que a primeira opção de tratamento na maioria dos casos não deve incluir a prescrição de antibióticos.

E porque, então, se toma tanto antibiótico no Brasil? Bem, basicamente há problemas relacionados com o paciente e problemas relacionados conosco, profissionais de saúde. Neste post me aterei a estes últimos, pois acho digno começar fazendo o mea culpa. Num próximo eu falarei sobre os erros mais comuns cometidos pelos pacientes. Como diria Jack, vamos por partes:

1) Para não prescrever antibiótico de cara pra um paciente eu preciso monitorá-lo. A intenção é dar uma chance para que o corpo do paciente se recupere da infecção por si só, mas, caso isso não ocorra, aí sim, o antibiótico deverá ser utilizado. Quem é usuário do nosso querido Sistema Único de Saúde, vulgo SUS, sabe que isso é quase impossível, certo? Mesmo para os pacientes particulares e de plano de saúde, muitos profissionais preferem usar logo um antibiótico a ficar no tal monitoramento. E por que isso? Bom, como em qualquer profissão do mundo, há profissionais de saúde E profissionais de saúde. Sendo assim, tem aqueles que simplesmente não querem ter trabalho. Mas...

2) Mas há também aqueles que temem a reação do paciente. Explico: para não prescrever antibiótico, é preciso que o paciente confie MUITO em você e entenda que sua escolha inicial é para o bem dele, podendo ser revista. O que ocorre é que, em alguns casos, o paciente sai sem a bendita receita de “qualquer ina” do consultório/hospital/posto de saúde e a infecção dele continua evoluindo. É uma chance que sempre existe, por isso é preciso o tal monitoramento. Só que esse paciente volta a se consultar e aí passam antibiótico (ou ele vai na farmácia e compra por conta própria) e então ele melhora. Só que o problema é que muitos saem detonando “aquela porcaria de médico/dentista” que não passou o remédio certo pra curar o problema dele logo de primeira. Complicado, né? Muita coisa teria que mudar nessa engrenagem para que chegássemos no nível de esclarecimento de uma Inglaterra.

3) Infelizmente, há outros motivos que levam o profissional a prescrever antibiótico 'de cara', entre eles a relação que há entre a indústria farmacêutica e os profissionais de saúde (farei um post sobre isso no futuro) e a falta de reciclagem dos profissionais, que não atentam pras novas guidelines que são lançadas a cada ano, persistindo em prescrições defasadas.

É muito importante notar, no entanto, que estou me referindo a casos onde o antibiótico poderia ser evitado. Há casos onde ele deve ser a primeira escolha e, para isso, há protocolos bem estabelecidos em cada especialidade e que devem ser seguidos pelo profissional. O objetivo desse post não é criticar toda e qualquer prescrição de antibiótico, mas o abuso do uso desses medicamentos. O mais importante de tudo é confiar no profissional que está conduzindo seu caso. =)

terça-feira, 9 de março de 2010

Além do Jaleco Branco

Após um fim de semana de saudáveis discussões no twitter sobre questões de saúde (no caso envolvendo o correspondente da globo em Londres Marcos Losekann e a Lelê do R7 e do TDUD?) percebi, pela resposta dos outro tuiteiros às questões levantadas por @alesie e @losekann o quanto esse mundinho profissional que eu habito pode ser algo tão distante daqueles que não o vivenciam.

Não vou dizer que minha intenção aqui é 'desmistificar' o que quer que seja, por que né, isso é coisa de gente órgão sexual masculino no orifício de término do sistema digestório, mas se der ao menos pra aproximar um pouquinho que seja a visão do 'doutor' da visão do paciente, tá valendo.